Se você gosta de adiar seus compromissos com certa frequência, sempre deixa para depois aquelas atividades consideradas trabalhosas ou se entrega constantemente aos famosos “cinco minutinhos a mais de sono”, você pode ter a tendência cerebral da procrastinação.
Em uma consulta rápida ao dicionário identificamos que o termo procrastinar vem do hábito de transferir para outro dia ou deixar para depois o que poderia ser feito hoje; adiar, delongar, postergar. Mas na verdade, trata-se de um fenômeno cerebral que provoca a sensação de prazer. Quem nunca deixou para outro dia algo desagradável e acabou bem feliz por isso? Pois então, é aí que mora o perigo.
Em busca da sensação de prazer
Quanto mais procrastinamos e na última hora damos conta daquilo que deveria ter sido feito com antecedência, mais uma sensação gostosa toma conta de nosso corpo, como se ter procrastinado fosse incrível, afinal, “acabou dando tudo certo”. Cuidado, esse comportamento pode viciar. Além disso, pode sim acabar dando tudo errado no final.
A cada atividade adiada ao máximo, por desorganização, preguiça ou por um alívio imediato, que ao final acaba dando certo, é reconhecida pelo cérebro humano como uma experiência emocional válida e fonte possível de prazer momentâneo, como uma descarga de alegria que inunda a mente com a sensação de prazer. Como a sensação é gostosa, o cérebro quer mais e mais e então você acaba procrastinando mais e mais. Tem início um ciclo que resulta em recompensas prazerosas comandadas pelo sistema emocional cerebral. Ao ser questionada pelo hábito de procrastinar é comum a pessoa responder que não sabe o motivo de ser assim, que vai mudar e não entende muito bem o porquê deixa tudo para a última hora. Relaxa!
O bloqueio da razão pela emoção
Nas ocasiões identificadas pela mente humana como possíveis fontes de prazeres rápidos, pode ocorrer uma inibição da única região que poderia sinalizar para o cérebro que ele está entrando em uma “furada”, a região responsável pela ponderação do pensamento, da busca pela razão humana, o córtex pré-frontal cerebral.
Tomando como exemplo o caso da procrastinação, ocorre que nessas ocasiões o sistema emocional é estimulado por descargas do neurotransmissor dopamina[1], que enquanto estimula o comportamento emocional de deixar para depois, tem ação inibitória na região do córtex pré-frontal, logo, a única região que poderia alertar a pessoa que tal comportamento poderia resultar em problemas futuros, é anulada. O que passa a ser percebido e valorizado é apenas o prazer momentâneo da ação.
Em todas as ocasiões que você age por impulso e logo percebe que “já era”, é bem provável que seu córtex pré-frontal tenha sofrido um blecaute causado pela liberação de grande quantidade de dopamina em seu sistema emocional.
Ficar atento a este movimento, ter consciência desse comportamento movido pela emoção é o primeiro passo para a reversão dessa situação.
Entra em jogo a inteligência emocional
A reversão desse processo cerebral passa primeiro pela consciência emocional. Observar suas próprias escolhas, decisões imediatas, comportamentos e questionar as razões de tudo isso, pode ser o primeiro passo. É preciso um tempo para a leitura de seus próprios sentimentos e emoções, que pode ocorrer através da auto-observação ou com a ajuda de um profissional da área da psicologia.
Dessa consciência nasce a possibilidade de estabelecer um diálogo entre o sistema emocional e o córtex pré-frontal cerebral, de modo que o comportamento humano não mais seja moldado apenas por descargas de dopamina, mas sim, por uma conexão ampla de neurônios que permita o acesso ao que chamamos de “Inteligência Emocional”, entendida como a capacidade humana de identificar os sentimentos e emoções com mais facilidade e tomar decisões conscientes.
Vamos nos observar mais?
Questionar o motivo de procrastinar é sem dúvida o primeiro passo, mas alguns outros comportamentos podem ajudar e estimular sua consciência emocional:
- Planeje seu dia, sua semana ou alguma atividade mais trabalhosa com etapas que realmente façam sentido para você e que sejam possíveis de serem cumpridas;
- Pense no tempo das atividades e inclua um tempo para você no decorrer do dia;
- Entenda o por que não dá para adiar a atividade e quais seriam os prejuízos desse adiamento para você ou para o grupo envolvido;
- Evite exagerar na autocrítica, isso pode atrapalhar o desenvolvimento de uma atividade e contribuir para a procrastinação;
- Entenda quais habilidades são necessárias para a execução da atividade pretendida, identificando as que você já domina e as que ainda precisa conquistar. O cérebro é plástico e pode aprender novas habilidades durante toda a vida;
- Estimule o desenvolvimento das funções executivas cerebrais, isso pode representar a chave da inteligência emocional.
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Boa leitura!
[1] Os neurotransmissores dessa família atuam no sistema nervoso central e influenciam, por exemplo, nosso humor. A dopamina é um neurotransmissor da família das catecolaminas, também conhecidas como aminas biogênicas.
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Roberta Bocchi
Atualmente é pesquisadora e estudiosa da área de Neurociência aplicada à Educação pela Faculdade de Ciências Medicas da Santa Casa de São Paulo. Trabalha como Supervisora de Ensino efetiva da Rede de Educação Básica do Estado de São Paulo, onde também desenvolve pesquisas na área de Financiamento Público Educacional, Gestão Escolar e Currículo.
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