Seu cérebro já está maduro?
A pergunta pode parecer bizarra, fantasiosa ou até inconveniente, mas na verdade, representa o fio de uma meada científica, explicada em detalhes nos estudos desenvolvidos pela neurociência.
Um bebê recém-nascido, de forma geral, apresenta uma formação cerebral básica, com as funções mentais preservadas, os hemisférios cerebrais formados, demais regiões do sistema nervoso central bem desenvolvidas e milhões de neurônios prontos para responderem aos estímulos externos e internos da nova vida. Porém, há uma região cerebral chamada de córtex pré-frontal que não nasce madura e só alcança seu amadurecimento em média aos 25 anos de idade.
Essa região depende de estimulação externa correta para se fortalecer e é acionada quando precisamos dar respostas mais elaboradas a situações diárias que não podem ser respondidas automaticamente. É a região responsável pelas escolhas humanas de cada dia.
Mas qual a sua função?
Apresenta a seguinte divisão e função:
– Funções Executivas básicas
- Memória de trabalho: memória de curto prazo, que utilizamos para significar a linguagem e informações rápidas, de uso momentâneo;
- Controle inibitório: aquisição do autocontrole, foco, atenção;
- Flexibilidade cognitiva: capacidade de modificar um planejamento, um pensamento diante de novos estímulos ambientais. Está relacionada com a criatividade.
– Funções Executivas complexas
- Planejamento: capacidade de organização das ações e pensamentos do momento e do futuro, organização da própria vida;
- Resolução de problemas: envolve as funções anteriores e se lança ao pensar organizado, impulsionando novas conexões neurais e evocação da memória;
- Raciocínio: metacognição – o pensar sobre o pensar.
Antes do desenvolvimento robusto dessas funções e do amadurecimento integral do córtex pré-frontal cerebral, a criança ou o adolescente é classificado como portador de um sistema nervoso central em desenvolvimento, pois além das questões relacionadas ao amadurecimento cortical cerebral, outras regiões e funções cerebrais também estão em pleno desenvolvimento, diante dos diversos estímulos do mundo.
Mas enquanto isso quem responde por esses novos estímulos?
Esse é o detalhe que faz toda a diferença quando o assunto é consumo de álcool, ou qualquer outra substância que possa causar dependência.
Durante o período de amadurecimento do córtex pré-frontal cerebral as respostas aos estímulos são dadas de preferência pelo sistema límbico, que basicamente regula as emoções e o comportamento social imediato humano. Para que uma resolução mental nessas áreas seja bem articulada, é preciso estabelecer um “diálogo” com a região responsável pela razão, o córtex pré-frontal cerebral.
Como tomar decisões de bases sólidas e responsáveis se a região cerebral onde esse processo se dá ainda está amadurecendo? Como então controlar de forma voluntária um consumo exagerado de álcool que pode se transformar em vício?
É sabido que o álcool em doses elevadas afeta o funcionamento químico do cérebro e desregula várias regiões e funções do sistema nervoso central, como por exemplo, as responsáveis pelo controle inibitório, pelo equilíbrio físico afetando o funcionamento correto do cerebelo e das funções motoras.
Esses prejuízos se tornam mais nocivos em um sistema nervoso central ainda em construção, pois pode impedir o pleno amadurecimento de várias regiões e funções cerebrais, que dependem de ambientes internos e externos saudáveis para se desenvolverem de forma plena.
Manter os adolescentes longe do álcool é uma tarefa árdua em uma sociedade onde o seu consumo está associado erroneamente a situações efêmeras de relaxamento, prazer e felicidade, produzindo uma sensação perigosa e também dependente de pertencimento grupal e de certa identidade social.
Lamentavelmente com certa frequência, assistimos uma aceitação familiar natural diante de um adolescente consumindo álcool, como se ele estivesse se tornando adulto, quase como um rito de passagem, mas não há um alerta sobre o fato desse consumo se tornar um vício e “acolher” outros vícios não tão toleráveis por essas mesmas famílias.
Um caminho possível e urgente é o enfrentamento dessas questões por toda a sociedade e pelo poder público, com acesso democrático a informação, tratamento e acolhimento dos jovens, tanto dos que já apresentam sintomas de dependência como dos que ainda engatinham nesse universo social de certa forma “aceitável”.
Falar sobre essas questões é imprescindível, pois nossa sociedade necessita com certa rapidez de mentes jovens saudáveis para conduzir esse universo conturbado chamado Brasil.