Dra. Roberta Maria Bueno Bocchi[1]
@robertabocchioficial
Este artigo foi publicado na Revista “A Escola Legal[2]” em 04/08/2024.
Em tempos sombrios, onde a chegada da parceria público-privada na Educação Pública do Estado de São Paulo, acompanhada da adoção de modelos diversos de plataformas digitais para aferir todo o processo pedagógico, é preciso parar e pensar profundamente sobre o novo papel do gestor escolar.
Muitos pesquisadores ao longo da história pensaram a gestão escolar, autores como Geraldo José Sant’Anna, Almir Vicentini, Casemiro de Medeiros Campos, Heloisa Lück, Adelar Hengemühle, entre outros, dedicaram tempo e estudo pesado no caminho de desvendar uma gestão escolar que considere a completude escolar, porém essa completude agora parece não mais existir.
Diante das diversas plataformas digitais adotadas pelo Estado para aferir resultados avaliativos, presença de alunos, tarefas de casa, entre outras atividades, o gestor escolar se transformou em um “desesperado cuidador” das plataformas digitais de sua escola, conferindo diariamente as digitações necessárias, cobrando agilidade/pontualidade de todos e lutando para manter o bom ranking de sua Unidade Escolar, do contrário, a permanência em sua função estará ameaçada pelo Estado. O cuidado com um currículo escolar dinâmico e participativo, a tão falada “gestão democrática” onde os diversos Conselhos Escolares se reuniam com tempo e espaço para decidir sobre os rumos educacionais da escola, a liberdade pedagógica e a curiosidade cognitiva, definitivamente, parecem ter ficado no passado.
O discurso do moderno e tecnológico
Com a chegada das parcerias público-privadas nas escolas, onde a gestão pedagógica realizada pelos profissionais da Educação dividirá espaço com uma gestão privada que se ocupará das questões financeiras e administrativas da escola, sobrará mais tempo ao gestor pedagógico para “cuidar” das diversas plataformas digitais, afinal, será o resultado dessas plataformas que indicará a “qualidade” educacional da escola. Quantidade e qualidade nunca estiveram tão embrulhadas!
A plataformização educacional e a parceria público-privada parecem chegar sem aviso, sem tempo e espaço para recusas, marcado pelo discurso da modernidade, dos novos tempos, do avanço tecnológico e da otimização de recursos financeiros. Há educadores que lutam contra essa nova forma de educação pública e há aqueles que se adaptam e percebem que preencher planilhas e usar slides prontos pode ser o caminho. Triste dicotomia educacional!
Abandono da estrutura funcional e física?
Diante desse cenário, de discursos modernos e tecnológicos, é preciso questionar se algumas questões básicas pendentes para que se possa ter Educação serão enfim resolvidas, como a garantia de acesso dos alunos à escola; aos que dependem de condução, que lhes sejam oferecidos transportes que obedeçam aos princípios determinados em Lei, oferecendo veículos equipados com todos os itens de segurança, próprios ao tipo de transporte a que se destinam, tendo como objetivo maior a segurança e o bem-estar do aluno; laboratórios de Química, Física e Biologia; “biblioteca” e não “sala de leitura” com acervo atualizado com a presença de uma bibliotecária; quadra coberta; espaço adequado para recreação e alimentação; itens de acessibilidade; além da presença de profissionais bem remunerados que não precisem de outra atividade para completar sua jornada diária de trabalho e seu orçamento mensal. E por fim, implantação de projetos e programas educacionais que correspondam às reais necessidades da comunidade escolar, consultando-a antes da implantação desses mecanismos os quais devem visar ao crescimento humano dessa comunidade.
Só cosmetologia, bits e etiquetas não resolvem
As questões aqui destacadas são essenciais para entender a política voltada à Educação Básica Pública do Estado de São Paulo e diretamente relacionadas ao financiamento público dessa Educação. Para que essas condições sejam plenamente garantidas, é necessário que haja o envolvimento dos sujeitos educadores e educandos durante todo o processo educacional, participando e decidindo sobre as políticas públicas a serem implantadas pelo Estado, tendo como objetivo, tornar a sociedade mais justa.
Essa participação está condicionada à vontade do querer, envolver-se nas questões financeiras e pedagógicas, fundamental para uma atuação mais pontual nas questões que envolvam a Educação Pública, valorizando a formação de Conselhos e Associações que realmente fiscalizem e tenham voz de decisão sobre os gastos educacionais e que briguem pela descentralização de verbas públicas destinadas a setores que exijam urgência de atitudes, para que a escola possa dar continuidade ao seu trabalho em tempo que não cause ainda mais prejuízo aos alunos.
[1] Doutora em Educação – Políticas Públicas/Currículo – pela PUC/SP; Mestre em Educação – Políticas Públicas – pela UNICID; Especialista em Neurociência aplicada a Educação pela FCMSCSP – Acesso www.robertabocchi.com.br
[2] Disponível em: https://aescolalegal.com.br/plataformizacao-da-gestao-escolar-em-spp/04/
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Roberta Bocchi
Atualmente é pesquisadora e estudiosa da área de Neurociência aplicada à Educação pela Faculdade de Ciências Medicas da Santa Casa de São Paulo. Trabalha como Supervisora de Ensino efetiva da Rede de Educação Básica do Estado de São Paulo, onde também desenvolve pesquisas na área de Financiamento Público Educacional, Gestão Escolar e Currículo.
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